Nesta quinta-feirra, dia 23 de
junho, celebramos a festa do Corpo e Sangue de Cristo. É um momento de oração,
reflexão, manifestação pública de nossa fé. É um momento importante, pois a
Igreja nos convida a parar.
O mundo cibernético e financeiro
ao nosso redor fala exatamente o contrário. Não se pode perder tempo, pois
tempo é dinheiro, é oportunidade. Precisamos correr, fazer as coisas
rapidamente para não perder tempo, ser dinâmico e eficaz.
Um “dia santo” é uma folga
durante a nossa jornada para parar, refletir, rezar. Parar para fazer um
balanço da situação da nossa fé e tomar consciência dos hábitos de
superficialidade e pressa que, às vezes, caracterizam a nossa relação com a
Eucaristia celebrada nas nossas comunidades.
Acredito que este é bom
momento para avaliar a nossa participação na Missa, celebrando o mistério da
Páscoa com a Cruz, Morte e Ressurreião do Senhor. Parar e nos perguntar como
nós ouvimos a Palavra e como nos alimentamos com o Pão que nos é dado como
presente.
A página de João que a liturgia nos propõe nesta solenidade
é algo que impressiona e fascina. Jesus diz para tomar e comer
sua carne e beber do cálice com o seu sangue! Parece loucura! Jesus está no
meio de nós com seu corpo, sua história, sua vida, o amor apaixonado, a sua
transparência da Face do Pai.
Comer a carne e beber o sangue
do Senhor é nutrir-se do coração ardente de amor, é assimilar o segredo da vida
mais forte que a morte, e descobrir que Deus é mais íntimo do que eu comigo
mesmo.
Comer e beber Dele é descobrir
que somente Ele alimenta e acalma as nossas inquietações, que só Ele pode dar
força e direção para nossa vida, que só Ele pode preencher nossas vidas de
beleza na quotidianidade.
Alimentar-nos d’Ele significa
o nosso "sim" ao projeto de vida que Jesus revelou da Cruz; é renunciar a ser os arquitetos da sua
própria vida e entrar em comunhão com o seu plano de amor.
Jesus não quer que suas palavras sobre o pão
descido do céu sejam interpretadas de modo alegórico ou como uma imagem
figurativa. Ele pede para que sejam percebidas exatamente como soam, sem
qualquer adição do pensamento humano. Elas são assim, assim devem ser
acolhidas, acreditadas e vividas.
O pão que desceu do céu é Ele, Jesus. Ele veio na
carne para habitar entre nós, para se fazer nosso alimento e nossa bebida de
vida eterna. Ele realmente nos dá a sua carne para que nós a comamos para não
morrermos para sempre.
Quando, no entanto, Ele anuncia esse mistério, os
seus ouvintes, ao invés de se abrirem à fé, começaram a discutir fortemente.
Eles gostariam de compreender primeiro, para depois acreditar. Com o mistério,
primeiro o acolhemos, vivemos, fazemos com que se torne nossa carne e nosso
sangue, O transformamos em nossa história. Vivido e concretizado em nós,
começamos a compreendê-Lo de acordo com a medida de inteligibilidade contida
nas palavras que o expressam e manifestam.
Jesus não se apressa em explicar o mistério. Ele
simplesmente se limita a reafirmar a realidade de seu corpo e de seu sangue
juntamente com a outra realidade de tomar, comer e beber. A carne deve ser
tomada e comida. O sangue deve ser tomado e bebido. Somente assim eles se
tornam em nós comida e bebida de vida eterna.
Jesus, porém, nos revela por que nós não morreremos
para sempre: porque com a sua carne comida e com o seu sangue bebido, nós
viveremos interiormente para Ele, na procura do perfeito cumprimento da Sua
vontade. Eis a grande diferença abissal que distingue a Eucaristia do
maná. O maná era só o pão da terra, alimentava o corpo do povo de Deus no deserto.
A Eucaristia, ao invés, é Deus mesmo que nos alimenta e nós nos unimos ao
Senhor. Quem assim se alimenta e se deixa converter e tornar-se “nova criatura”
poderá também experimentar a possibilidade de fazer o bem.
Neste dia em que manifestamos, diante de um mundo
em mudança, a nossa fé na presença real de Cristo Eucaristia e nos
comprometemos com um mundo novo, peçamos à Virgem Maria, Mãe da Redenção, aos Anjos
e Santos que nos ajudem a viver e aumentar a fé nesse mistério.
Que a passagem de Cristo na Eucaristia pelas nossas
ruas e praças nos comprometa a sermos, também nós, pessoas alimentadas pela
Eucaristia, que passam pelas estradas do mundo proclamando Cristo Jesus
Ressuscitado, vida para o mundo!
† Orani João Tempesta, O. Cist.
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de
Janeiro, RJ
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